Dia de celebração para arte popular brasileira. Responsável pelo despertar das elites intelectuais para a cultura do povo, Vitalino Pereira dos Santos criou uma escola de escultura em cerâmica que virou marca do Nordeste. Símbolo representativo dos costumes e das tradições de um povo que tem muitas histórias para contar. Mesmo sem ter noção do que estava fazendo, o mestre se preocupou em perpetuar a sua arte como garantia de futuro para o Alto do Moura, o povoado que deu a Caruaru o título de Maior Centro de Artes Figurativas das Américas, concedido pela Unesco. Confira a programação da festa na arte ao lado.
Apesar de analfabeto, Vitalino era muito inteligente e nas conversas que tinha com o amigo, poeta e ceramista Manuel Galdino ensinava: “Professô, siga na arte, só que não repita o que eu faço”, registrou o pesquisador Paulino Cabral de Mello, na biografia Vitalino sem o barro: o homem. Seguindo os passos de Vitalino, cerca de 400 artesãos enchem as ruas e as casas do povoado distante seis quilômetros do centro de Caruaru, de vida, vida vitalínica.
Outro centenário em 2009, o ex-arcebispo de Olinda e Recife, dom Helder Camara (falecido em 1999), em artigo sobre a capacidade inventiva do povo lembra que Vitalino e outros artistas se aproximam e reverenciam a criação de Deus. Crianças, adultos e idosos mantêm viva a tradição de Vitalino. Só de familiares do mestre são cerca de 50 pessoas, incluindo vários bisnetos. Dos cinco filhos dois seguem a escrita do pai: Manuel e Severino Vitalino, de 74 e 69 anos, respectivamente.
O mais velho Amaro, de 75 anos, abandonou a arte na década de 80, após perder o movimento de um punho. Das duas filhas do mestre, Maria José, de 61 anos, já fez bonecos, tomou conta do museu, mas também com problemas de saúde largou a arte. A irmã dela, Maria Pereira, de 71 anos, saiu de casa por amor aos 17 anos causando muito desgosto ao pai e não trabalha na área.
No esforço para garantir melhores condições para a família, Manuel reduziu a sua produção só depois que incentivou seus quatro filhos e dois netos na arte. Um dos mais ativos é Vitalino Neto, que colabora ensinando técnicas de modelagem em barro em feiras e escolas. “É fundamental manter viva a memória do meu avô por tudo o que ele representa para Caruaru e para o Brasil”, destaca o artesão responsável ainda por alimentar duas comunidades no orkut (site de relacionamentos), que tem como tema o Mestre Vitalino.
Severino contribui administrando a casa museu onde são expostos pertences e réplicas de peças de Vitalino e gerando uma prole de artesãos. Ele teve 13 filhos, que lhe deram 23 netos e 10 bisnetos. “Quase todos estão envolvidos com a arte. Vitalino já tem vários bisnetos seguindo seus passos e os tataranetos são muito novinhos ainda”, afirma Severino. A maioria não seguiu o conselho do mestre e segue mais repetindo suas peças. Também herdeiros de Vitalino, as famílias de José Antônio da Silva, o Zé Caboclo (falecido em 1973) e de Manuel Eudócio se destacam. Os dois dialogavam muito com o mestre sugerindo, inclusive, mudanças nas peças como os olhos em relevo.
Obras sobre o ceramista
– Após sua morte, em 1963, Vitalino tornou-se tema de muitas monografias, dissertações e teses. Foi homenageado com as músicas Vitalino de Onildo Almeida, gravada por Marinês, e Deus do barro, de Petrúcio Amorim, Marron Brasileiro e Rogério Rangel e a premiada peça de teatro O auto das sete luas de barro, direção de Vital Santos. O mestre ainda foi citado em outras canções como A Feira de Caruaru, também de Onildo (1956), eternizada por Luiz Gonzaga, Leão do Norte, Lenine e Paulo César Pinheiro, entre outras.
– Vitalino também virou pop e se tornou tema de enredo de várias escolas de samba do Rio de Janeiro e São Paulo. Em 1977, o carnaval da Império da Tijuca teve como tema O mundo de barro de Mestre Vitalino, reapresentado este ano. A Mocidade de Padre Miguel incluiu o mestre no enredo Brasiliana, no ano seguinte. Em 1982, foi a vez da Beija-Flor cantar “mas Mestre Vitalino molda em barro o destino do povo sofredor”. No ano seguinte, a Unidos da Tijuca teve como enredo Devagar com o andor que o santo é de barro. Todas do Rio.
– Tocador de Pife. Na sua primeira viagem ao Rio, em 1960, Vitalino conseguiu gravar com o apoio do Ministério da Cultura o compacto Vitalino e seu Zabumba, com seis músicas instrumentais, entre elas Improviso, de autoria do mestre. Vitalino tocou o primeiro pife na Zabumba do Mestre Vicente na gravação.
– Em documentários Vídeo – O mundo de Mestre Vitalino, de Armando Laroche (1953), Adão foi feito de barro, de Fernando Spencer (1976), Vitalino, Lampião, de Geraldo Sarno (1977). Áudio – A arte de modelar o Nordeste, de Pedro Henrique Marins (1991)
– Em livros Vitalino, um ceramista popular do Nordeste, de Renê Ribeiro (1959) Mestre Vitalino, de Lélia Coelho Frota (1986) Vitalino sem barro: o homem, de Paulino Cabral de Mello (a mais completa biografia – 1995). Vários livros de arte têm capítulos e citações sobre a vida e a obra de Vitalino
Programação do centenário
NO ALTO DO MOURA
15h – Lançamento do selo dos Correios e da medalha comemorativa do Centenário do Mestre Vitalino –
Casa da Moeda do Brasil e Clube da Medalha do Brasil
16h – Inauguração da estátua do Mestre Vitalino – jardins da casa-museu
17h – Desfile de 26 grupos de cultura popular pelas principais ruas do Alto do Moura. Local: Em frente ao Museu do Mestre Vitalino (Rua Mestre Vitalino, s/n – Alto do Moura – Caruaru).
EM CARUARU
19h – Espetáculo: O auto das sete luas de barro, direção de Vital Santos, marcando a reinauguração do Teatro João Lyra Filho.
22h – Petrúcio Amorim, Elifas Júnior, Geraldinho Lins, Hebert Lucena, Waldir Santos e Bia Marinho. No Parque de Eventos Luiz Gonzaga.
Fonte: Diário de Pernambuco