A destruição das matas ciliares e de outras matas protetoras, combinada com a redução da correnteza, provocada pela retenção das águas por represas, é responsável pela aceleração do assoreamento do Rio São Francisco.
Por conta disto, um fenômeno não obstante comum, tem ocasionado, ao longo de décadas, a formação de coroas e ilhas no leito do rio, que são observáveis em diversas partes dos seus trechos. A falta de chuva agrava o problema, diminuindo o volume de água e expondo as áreas assoreadas (coroas).
No município de Morpará, localizado no médio São Francisco, em vários trechos foram formadas piscinas naturais. No trecho que corta a cidade, de aproximadamente 2 quilômetros de extensão, o rio corre sinuosamente entre barrancas que têm cerca de um metro de altura em relação à superfície das águas. A formação de “coroas”, pequenas ilhas de areia é um fenômeno que acontece todos os anos, mas os ribeirinhos e pescadores garantem que nunca se viu algo parecido. O rio tá seco demais, muito raso, pode atravessar por praticamente toda a sua extensão a pé, caminhando, pois dificilmente é encontrada uma profundidade de mais de meio metro de altura.
Em praticamente todas as áreas assoreadas do leito do Rio São Francisco, observa-se intensa atividade agrícola, associada a práticas de manejo inadequadas, queimadas, subtração da vegetação ciliar, loteamentos de urbanização, parques industriais de alto potencial poluidor, estruturas de lazer não regulamentadas e emissão de esgotos sem nenhuma forma de tratamento. Este uso múltiplo das águas tem transformado totalmente o leito natural do rio.
Diz a lenda que o São Francisco nasceu das lágrimas derramadas pela índia Irati. Com saudade do bravo companheiro que foi lutar pela posse da terra contra o homem branco e não voltou mais, Irati sentou em uma pedra e chorou dias. De tão grande sua tristeza deu origem ao Opará, que significa rio-mar, na linguagem indígena.
O desprezo de Irati, pela tristeza em ver a atual situação que se encontra o que supostamente foi responsável em criar, faria com que surgissem dezenas de rios São Francisco, tamanha seria a extensão das águas derramadas por seu choro. Desde o descobrimento do rio pelo navegador italiano Américo Vespúcio, o São Francisco nunca se pareceu tanto com um lamento. O Velho Chico, apesar de continuar belo, jamais esteve tão maltratado.
Segundo a Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, os sedimentos (detrito rochoso resultante da erosão) já são registrados no leito do rio a taxas “altíssimas”. É como se fossem despejados no ano milhares de toneladas de terra no leito do rio. O assoreamento é tão sério que em muitos trechos, o transporte de passageiros e cargas já não existem mais, ou estão comprometidos.
De acordo com os estudos e com os relatos dos próprios moradores das comunidades ribeirinhas, o leito do rio está a cada ano mais assoreado e poluído. Os prejuízos ambientais são incalculáveis, o que, consequentemente atinge diretamente pequenos agricultores e pescadores que vivem exclusivamente do que as águas do rio oferecem, ou ofereciam. Os pescadores costumam dizer que existem mais pescadores que peixe.
O prefeito do município de Morpará, Sirley Novais Barreto, conhecido como Lelei, demonstra preocupação com a situação do rio. Segundo ele, a Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente da cidade estará encaminhando um relatório sobre a atual situação do rio para os órgãos estaduais e federais ligados ao meio ambiente. “Esperamos encontrar uma maneira para que haja uma reversão da situação. Acreditamos e desejamos que no próximo governo este trabalho tenha continuidade, pois assim poderemos sonhar com um ‘novo’ Velho Chico, totalmente vivo e responsável por milhares de vidas”, filosofou o prefeito Lelei.
Na cidade de Morpará, as Coroas viraram a principal área de lazer. Famílias inteiras aproveitam os dias ensolarados para banharem nas águas do Rio São Francisco.
Por Gervásio Lima – Jornalista e historiador