No último sábado (24) o assunto eclodiu novamente à minha frente. Aproveito para ajudar na polêmica, ou para tentar rememorar alguns fatos, reforçados por uma rápida pesquisa.
Rememorar os fatos
Recorro ao assunto, por que, para muitos, a comparação é algo desproposital. Para analisar as comparações, sem querer convencer o leitor, sugiro rememorar alguns fatos, porque talvez seja a ausência deles que tenha influenciado aos mais precipitados.
Homens diferentes?
E antes mesmo de me aprofundar na análise, denuncio um paradigma que parece dominar o pensamento das gerações do “futebol moderno”. Para eles, neste e noutros casos, o passado parece não contar, porque os homens não eram homens, os gênios não eram gênios, a arte não era arte, e o craque de então era um ser inferior ao atual.
Condições
Como Pelé e Messi jogaram em épocas diferentes, também cabe uma reflexão sobre o que já ouvi em relação às condições que cada um encontrou para jogar. “Naquele tempo era tudo mais fácil”, disseram, desmerecendo Pelé. Avalie você mesmo: hoje o gramado é um tapete, antes cheio de buracos; a bola é feita com todas as tecnologias, antes era de couro e oval, pelo menos em algum tempo; a chuteira de hoje é um luxo, antes era com o couro duro furando o pé; hoje, as regras protegem os jogadores, antes precisava alguém quebrar a perna para o juiz agir; hoje, os salários… Enfim.
Passa por Maradona
Pois bem, um paralelo entre Pelé e Messi, primeiro passa por Maradona, porque este também foi objeto de discussão nesta mesma ótica. Os afoitos, para afirmarem que Messi é igual ou até melhor do que Pelé, falavam o mesmo quando Maradona estava em evidência. Parado, gordo e afastado da mídia, Maradona também já não é mais o Deus dessa gente: agora é Messi.
Messi x Neymar
Messi tem feito muitos gols pelo Barcelona, tem conquistado títulos, inclusive o de melhor jogador do mundo três vezes. Tem realmente deslumbrado nos gramados, principalmente depois daquela final contra o Santos, quando houve o confronto com Neymar e o argentino venceu por mil a zero. Mas, para quem conhece futebol, sem querer fazer comparação, naquele jogo Messi tinha Xabi Alonso, Iniesta e Daniel Alves ao seu lado, enquanto Neymar tinha apenas Ganso, mas, como todo o time do Santos, completamente fora de sintonia.
Mais dez anos
Messi já está na galeria dos melhores do mundo e ainda vai continuar deslumbrando, porque o seu futebol, a sua idade e o seu talento permitem dizer isso. Mas, convenhamos, se não existir uma continuidade nos próximos dez anos, talvez a história não mude o que já foi construído pelo Rei do Futebol durante os seus 20 anos de carreira. É o Atleta do Século, eleito e reeleito.
Mundo se rende
Mesmo com tantas glórias, falta ao astro argentino vencer uma Copa do Mundo, pelo menos uma, porque o Rei já tem três. Mas é preciso vencer uma Copa do Mundo com 17 anos, assombrando o planeta, dando lençol em zagueiro, conquistando um espaço para a Argentina, como Pelé fez para o Brasil, fazendo o mundo se render aos seus pés a partir de 1958.
Mil gols
Talvez Messi precise marcar pelo menos mil gols, porque o outro já tem 1.281; talvez precise ser campeão paulista 15 ou 20 vezes, ser artilheiro 11 vezes, porque o outro abusou de fazer essa conta; talvez precise ser campeão mundial interclubes mais vezes para superar os dois títulos do Rei; talvez precise parar uma guerra ou recuperar as Malvinas para a Argentina.
Virtudes
O que mais impressiona os que vieram na era Messi possa ser as suas jogadas, os dribles curtos em velocidade, os cabelos escorridos nos ombros, as cores vibrantes do Barcelona, a organização do futebol europeu e as mil e umas possibilidades de mídias para registrar tudo.
Jogadas sem imagem
Pelé não teve tudo isso, pois era preto e feio, e ser assim em um país em que as desigualdades imperam conta muito. Pelé não teve a mídia aos seus pés com a mesma intensidade de hoje: mil TVs, rádios, internet, e uma tecnologia avançadíssima. Que pena que não tenham visto o famoso gol da Rua Javali, quando Ele meteu seis chapeletas nos adversários (o filme está aí). Ou aquela subida no último andar e descer com a bola colada ao peito e estufar as redes adversárias; ou aquela matada, a paciência, a visão do campo para a chegada de Carlos Alberto e a bola estufando as redes italianas.
A melhor jogada
Ah, sim, por falar em jogada, que tal rever aquela que o gol não saiu, contra o Uruguai, na Copa de 1970? (Jogada a partir do 1:04min do vídeo) Tostão enfia matematicamente entre o goleiro e o beque. O “monstro” se aproxima, deixa o zagueiro para trás e vai para a dividida com o goleiro. Sem tocar na bola, dá um drible de corpo, foge do choque e chuta para o gol. Como ele botou ‘giz’ demais no taco, a bola não entrou. Melhor assim. Se tivesse entrado, talvez este não tivesse sido o lance mais impressionante que o mundo do futebol já viu.
Febre de alguns anos
Portanto, são alguns detalhes que me fazem ver que tal comparação é mais do que precipitada. Anos atrás, quando estava no auge, no mesmo Barcelona, Ronaldinho Gaúcho foi considerado por Tostão (talvez o mais ético, entendido e isento analista do futebol brasileiro) como “chegando” ao mesmo nível de Pelé. Pouco tempo depois, passada a febre, o próprio Tostão reconheceu que tudo não passara de uma ilusão momentânea que ele tivera.
Amarelou
É bom lembrarmos que os grandes jogadores – os gênios – têm que passar pelo crivo de uma Copa do Mundo, principalmente vencendo-a. Por isso, não custa lembrar da Copa de 2010, quando a Argentina foi eliminada pela Alemanha de forma humilhante e Messi, para a mídia, “amarelou”. Os mesmos que o endeusaram antes “compraram” o que a mídia vendeu naquele momento. E se, no futuro, Messi sofrer um novo revés, os mesmos irão mudar de posição silenciosamente.
Bom dia Maradona
Como a mão que afaga é a mesma que apedreja, talvez Messi reverta essa situação. Mas, enquanto isso não acontece é bom dar bom dia a Maradona, porque, este sim, esteve bem mais próximo de poder ser comparado a Pelé, cujo nome se transformou, para não esquecer, em significado de ser bom.
Veja aqui algumas das melhor jogadas do Rei Pelé.
Confira um compacto com as melhores jogadas do argentino Messi.
Por Evandro Matos